O lado da Copa que poucos conhecem - 1954
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QUINTA COPA DO
MUNDO DE 1954
O governo comunista de Budapeste transformou os atletas em soldados e criou uma
seleção imbatível, que jogou 27 vezes de junho de 1950 até a estréia na Copa de
1954. Ganhou 23 jogos e empatou 4.
A Suíça foi eleita para organizar a Copa de 1954 em 1946, no congresso da FIFA
em Luxemburgo. Havia vários motivos para escolher o pequeno país europeu e um
deles era o cinqüentenário da própria FIFA, cuja sede fica em Zurique. Um grupo
encabeçado por Ernst Thommen, presidente da Federação Suíça de Futebol, começou
a preparar a Copa em 1949.
Pela primeira vez, foram negociados os direitos de transmissão para rádio, TV e
filmagem. Assim, a Copa de 1954 foi a primeira a ter um filme oficial,
preservando em celulóide, para as futuras gerações os gols e os lances. E foi
também a primeira a ter transmissão televisiva ao vivo. Somente para oito países
da Europa: França. Inglaterra. Alemanha. Itália. Holanda. Bélgica. Dinamarca e a
própria Suíça. No Brasil, os torcedores tiveram que se contentar em acompanhar o
mundial pelo rádio. As primeiras cenas da Copa só chegaram as salas de cinema um
mês depois.
Um mês antes do inicio da Copa na Suíça uma pergunta percorria a Europa: quem
seria o vice-campeão do mundo? A não ser que acontecesse uma improvável
catástrofe, o titulo já tinha dono: A Hungria. A melhor seleção do inicio de
1950 representava a radicalização dos conceitos implantados na década de 1930
por Benito Mussolini, na Itália e Adolf Hitler, na Alemanha – os ditadores que
haviam percebido as vantagens de associar o esporte ao Estado e, para isso,
deram todas as condições materiais para que fossem formadas equipes vitoriosas.
A seleção húngara tinha um passo adiante: não apenas tinha as bênçãos oficiais
como passou a ser propriedade do governo. No dia 23 de maio de 1954, um mês
antes do inicio da Copa, em Budapest, a
Hungria atropelou a Inglaterra por 7x1. Não restava duvidas: a Hungria, com sua
perfeita fusão de força, talento e disciplina, transformaria o Mundial num
parque de diversões.
Depois de muitos discursos patrióticos, nossa delegação embarcou com feijão,
carne seca e goiabada na bagagem. Tudo para descobrir que ainda havia um
fantasma: a Hungria. Em 24 de maio de 1954, os jogadores, intoxicados pelos
discursos nacionalistas que tinham de ouvir diariamente, foram recebidos pelo
presidente Getulio Vargas, no Rio, para escutar mais um. E Getulio sacou de seu
repertório populista que os atletas “representavam a força e a resistência da
raça brasileira”. Em seguida, fez o milésimo apelo para que eles ganhassem a
Copa. A meia noite, a bordo de um avião Constellatiom, da Panair do Brasil, a
seleção alçou vôo do aeroporto do Galeão, com direito a banda de musica e mais
falatórios de políticos oportunistas.
Na Suíça, a delegação ficou concentrada em Macolim, uma escola recém-inaugurada
perto da cidade de Bienne. Além dos jogadores e dos integrantes da comissão
técnica, também ficou hospedado no local o filho de Zezé Moreira, Wilson,
atacante reserva do Botafogo que viajou com a estranha função de “participar dos
treinos”. Já os cartolas da CBD e outros 20 convidados e agregados preferiram se
acomodar no Elite Hotel, no centro de Bienne, mesmo endereço de 60 jornalistas e
radialistas brasileiros. Na concentração a grande pergunta era sempre a mesma:
Será que os brasileiros vão amarelar diante dos húngaros? Assim, os nossos
jogadores, saudosos por natureza, vitimas de futuros preconceitos por parte dos
árbitros, tendo que responder diariamente a perguntas sobre a Hungria e
intimados a defender a pátria com brio e destemor, viam chegar à hora de entrar
em campo.
Jogo final – 4 de julho de 1954.
Alemanha 3 x Hungria 2.
Gols de Puskas (Hungria). Czibor (Hungria). Morlok (Alemanha) e Rahn (Alemanha)
no primeiro tempo. Rahn (Alemanha no segundo tempo).
Juiz: William Ling (Inglaterra).
Estádio: Wankdork, em Berna.
Publico estimado: 42.000 torcedores.
Alemanha: Turek. Posipal e Liebrich. Kohlmeyer. Eckel e Mai. Rahn. Morlock.
Ottmar Walter. Fritz Walter e Schafer.
Hungria: Grosic. Buzanski e Lorant. Lantos. Bozsic e Zakarias. Toth. Kocsis.
Hidegkuti. Puskas e Czibor.
O Brasil enviou 22 jogadores.
Carlos José CASTILHO (Fluminense).
VELUDO Caetano da Silva (Fluminense).
CABEÇÃO Luiz Moraes (Corinthians).
João Carlos Batista PINHEIRO (Fluminense).
MAURO Ramos de Oliveira (São Paulo).
ALFREDO RAMOS Castilho (São Paulo).
DJALMA dos SANTOS (Portuguesa).
PAULINHO Paulo de Almeida Ribeiro (Vasco).
NILTON SANTOS (Botafogo).
ELI do Amparo (Vasco).
José Carlos BAUER (São Paulo).
BRANDÃOZINHO Antenor Lucas (Portuguesa).
DEQUINHA José Mendonça dos Santos (Flamengo).
DIDI Valdir Pereira (Fluminense).
RUBENS Josué da Costa (Flamengo).
JULINHO Julio Botelho (Portuguesa).
MAURINHO Mauro Raphel (São Paulo).
INDIO Aloísio Francisco da Luz (Flamengo).
HUMBERTO Tozzi (Palmeiras).
BALTAZAR Osvaldo da Silva (Corinthians).
PINGA (José Lazaro Robles (Vasco).
Francisco RODRIGUES (Palmeiras).
Comissão técnica:
Chefe da delegação: João Lyra Filho.
Técnico: Zezé Moreira.
Assistente técnico: Luiz Vinhaes.
Médico: Newton Paes Barreto.
Massagista: Mario Américo.
Roupeiro: Aloísio Alves.
Cozinheiro: Laudelino de Oliveira.
A polêmica sobre o “trauma” dos jogadores brasileiros, incapazes de se superar
em momentos decisivos, dominou os debates durante a Copa. Ao ver o goleiro
Castilho se emocionar ao receber as primeiras fotos de sua filha Shirley, que
nascera em Bonsucesso quando a seleção já estava na Suíça, o técnico Zezé
Moreira comentou – “Nosso maior inimigo é a nostalgia. Os jogadores ficam horas
e mais horas perdidos na saudade. Muitos escrevem cinco cartas por dia para a
família”.
Iugoslávia 1 x França 0 foi o primeiro jogo das Copas a ter transmissão direta
pela televisão. E também o primeiro em que os jogadores atuaram com numeração
pessoal. Cada inscrito recebeu um numero de 1 a 22, para ser usado na camisa. O
critério dessa numeração ficava a carga de cada Federação.
Seis dias antes da estréia, a delegação sul-coreana tomou um trem de Seul até
Busan, de onde seguiu de barco até o Japão. De lá, um grupo seguiu num vôo
regular da Air France e o restante pegou carona num avião que só chegou à Suíça
na véspera do inicio da Copa. Os jogadores fizeram exercícios no hotel e
dormiram até a hora de entrar em campo.
O técnico Zezé Moreira decidiu isolar a Seleção durante 72 horas, para evitar o
assédio da imprensa. Só os dirigentes puderam entrar na concentração, como se
eles fossem ficar quietinhos. Após o treino de sexta feira, o ministro Lyra
Filho reuniu os jogadores e leu, em voz alta, vários telegramas que haviam
chegado do Brasil – todos falando em patriotismo, honra e dignidade. E concluiu:
”façam milagres, mas derrotem os húngaros”.
A história consagrou a derrota da Hungria em 1954 como uma monumental surpresa
bem maior que a derrota do Brasil para os uruguaios em 1950. Ao pisar em campo
para enfrentar a Alemanha, os húngaros defendiam uma longa invencibilidade de 31
jogos. Além disso, nos quatro jogos disputados durante Copa, haviam marcado 25
gols e sofrido 7 e sem contar com seu melhor jogador, Puskas, nos jogos contra
Brasil e Uruguai. A única voz dissonante sobre o favoritismo magiar era de Jules
Rimet. Recordando o que tinha visto no maracanã em 1950, ele desconversava: Não
sei... a Copa do Mundo é cheia de surpresa.
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